Sangha
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Estudos Budistas
Tradição
do Ven. Thich Nhat Hanh
Amor, desejo e intimidade
Dissemos no início que os prazeres sensuais, o desejo sexual não é amor, mas a nossa sociedade está organizada de tal forma que o prazer sensual se torna a coisa mais importante. Eles querem vender seus produtos e fazem propagandas, regam a semente do desejo que há em você; eles querem que você consuma para ter prazer sensual. Mas os prazeres sensuais podem destruir você.
O que precisamos profundamente é de compreensão – compreensão mútua, confiança, amor, intimidade emocional, intimidade espiritual. Mas não temos a oportunidade de satisfazer esse tipo de necessidade profunda que existe em nós.
Muitos jovens da nossa sociedade desejam fazer uma cirurgia estética para atingir o padrão de beleza. Há revistas de moda feminina que nos dizem que para ter sucesso é preciso ter esta aparência e usar este tipo de produtos e se você quer ser uma mulher de sucesso, tem que ter essa aparência. É por isso que muitos jovens sofrem muito, porque não conseguem aceitar o seu corpo, querem que o seu corpo seja diferente, porque as outras pessoas esperam outro tipo de corpo. É por isso que querem fazer uma cirurgia para transformar o corpo.
Quando você não aceita seu corpo como ele é, você não está em seu verdadeiro lar. Seu corpo é uma espécie de flor. Todo ser humano, toda criança nasce no jardim da humanidade como uma flor e as flores são diferentes umas das outras. “Inspirando, me vejo como uma flor. Expirando, sinto-me revigorado.” Todo mundo é uma flor no começo e ela tem que se aceitar como uma flor diferente dos outros tipos de flores.
Se ela aceitar seu corpo, então ela terá a chance de ver seu corpo como um lar. Se você não aceita seu corpo, não pode ter um lar. Se você não aceitar sua mente, não poderá ser um lar para si mesmo. E há muitos jovens que não aceitam o seu corpo, que não aceitam quem são. Eles querem ser outra pessoa. E como você pode estar em casa para si mesmo? Como você pode estar em casa para a outra pessoa?
É por isso que nos meios educacionais temos que dizer às pessoas que elas já são lindas como são, não precisam ser outra pessoa. Thay tem uma caligrafia: “Seja lindo, seja você mesmo”. “Seja linda, seja você mesma.” Essa é uma prática muito importante. Você tem que se aceitar como você é.
Quando você pratica construir um lar em si mesmo, você fica cada vez mais bonito. Você tem paz, você tem calor, você tem alegria, você se sente maravilhoso dentro de si mesmo. As pessoas reconhecerão a beleza da sua flor. Porque você nasceu como uma flor no jardim da humanidade.
Os monges, as monjas, quando recebem os preceitos bikkshu ou bikkshuni, querem viver uma vida santa. Se você vê que um monge é lindo é porque ele trouxe o elemento espiritual para sua vida. Se você vê uma monja bonita, é porque ela trouxe um elemento de espiritualidade para sua vida. Espiritualidade aqui significa atenção plena, concentração e insight.
Os Cinco Treinamentos de Plena Atenção são recomendados para todos, não apenas para monásticos, mas também para leigos. Plena Atenção é o tipo de energia que pode ajudá-lo a voltar para o lar, para si mesmo - para estar no aqui e no agora, para que para que você saiba o que fazer e o que não fazer, para se preservar, para construir o seu verdadeiro lar, para transformar as próprias aflições e ser o lar de outras pessoas.
Os 5 Treinamentos de Plena Atenção são a forma muito concreta de praticar a atenção plena, e eles fazem de você santo. As pessoas falam de santidade, mas não sabem exatamente o que significa ser santo. Na tradição budista, a santidade é feita de atenção plena e a atenção plena traz dentro de si as energias da concentração e do insight. A atenção plena, a concentração e o insight tornam você santo. Assim, a santidade é possível para os monges e monjas, mas também para os leigos que praticam os preceitos.
A santidade não existe apenas com o celibato. Há aqueles que são celibatários, mas que não são santos. Porque eles não têm atenção plena, concentração e insight suficientes. Há quem viva uma vida conjugal, mas se tiverem atenção plena, concentração e discernimento, terão em si o elemento de santidade.
Se os monges observam o celibato – não terem relações sexuais – isso não significa que as relações sexuais não possam ser sagradas. Mas como monge, você tem que se comportar assim, ser celibatário. É como um astronauta: indo para o céu, você não deveria estar grávida. Se você está grávida, não pode ser astronauta, não é porque estar grávida é algo ruim.
O corpo humano pode ser algo muito bonito. Já disse antes que o corpo humano é uma flor real. Vimos muitas coisas bonitas ao nosso redor. Uma árvore pode ser muito bonita. Uma flor pode ser muito bonita. A neve, o rio, o salgueiro, muitas coisas lindas. Um pássaro, um cisne, um cavalo, um cervo podem ser muito bonitos. E o corpo humano é uma das coisas mais bonitas que podemos ver. Mas temos que aprender a tratar a beleza. Temos medo de contemplar a beleza. Mas não devemos nos comportar de maneira a destruir a beleza.
A intimidade sexual pode ser uma coisa linda se houver atenção plena, concentração e insight, compreensão mútua e amor. Caso contrário, será muito destrutivo. No sutra, eles descreveram o momento em que a Rainha Maha Maya ficou grávida do Buda. Em seu sonho, ela viu um elefante branco, muito gentil. Maha Maya sonhou com um elefante branco. Sua tromba segurava uma flor de lótus e o elefante a tocou com a flor de lótus e entrou nela muito, muito suavemente e ela ficou grávida de Siddharta. É assim que descreviam a relação sexual no palácio antes de Siddharta ser concebido: gentileza, beleza.
Mas como aprendemos desde o início: a intimidade sexual não deve ocorrer antes de haver comunhão, compreensão, partilha a nível emocional e espiritual. Então a intimidade física e sexual também pode se tornar sagrada.
Praticar o budismo como monge é sempre mais fácil do que praticar como leigo. O ditado vietnamita diz, "Praticar como monge é mais fácil; praticar como leigo é muito mais difícil." Portanto, abster-se completamente de todas as atividades sexuais é muito mais fácil do que ter relações sexuais, porque para ter relações sexuais num contexto de compreensão e amor mútuos, é necessária muita prática. Caso contrário você cria sofrimento para ele, para você, para ela. No budismo temos o ensinamento dos quatro elementos do amor verdadeiro, os Quatro Bramaviharas.
Há um jornalista que teve quatro amantes ao mesmo tempo, na França. Uma em Bordeaux, uma em Lyon, uma em Marselha e assim por diante. A que morava em Paris o amava muito. Ele lhe disse muito francamente que tinha quatro amantes e que ela era apenas uma delas. E aquela senhora realmente o amava.
Mas um dia, antes que ele quisesse dormir com ela, ela disse: "Agora, vamos sentar juntos e respirar, e olhar profundamente para ver o que realmente precisamos. Querido, eu realmente preciso de você. Preciso que você esteja ao meu lado, para me entender, para cuidar de mim, para me ajudar quando tenho dificuldades. É disso que eu preciso. E quando você não está desse jeito, eu sofro.” E várias sessões sentado assim ajudaram ele a entender que o que ele tinha feito não era amor Era apenas desejo. Como ela é uma praticante, ela o ajudou a entender. Finalmente, ele decidiu se casar com ela e largar as outras três pessoas.
Há uma médica na Suíça, que veio praticar em Plum Village e sofreu várias vezes em relacionamentos. Ela não conseguia dizer não a um homem quando ele pedia relações sexuais. Desde quando ela era jovem, toda vez que lhe pediam para ter um relacionamento sexual ela tinha que dizer sim, mesmo que não se sentisse pronta, porque ela estava com medo.
Muitos adolescentes do nosso tempo se sentem assim. Eles não gostam, não querem, não se sentem preparados para isso. Mas eles não ousam dizer não por que têm medo de serem vistos como estranhos, diferentes, anormais. Muitos jovens têm medo, mas não ousam dizer não. Eles não querem ser rejeitados. Eles querem ser aceitos. Esse é um fato psicológico do qual pais e professores devem estar cientes. Temos de dizer aos nossos filhos, aos nossos alunos, aos jovens, que devem aprender a dizer não quando não estão preparados, quando têm medo. Caso contrário, destruirão o seu corpo e a sua mente. Em nossa época, é muito difícil para eles dizer não.
(Palestra de Darma: em 26 de dezembro de 2010– transcrito do vídeo do YouTube
https://youtu.be/s0C6p4n3eks)
Traduzido por Leonardo Dobbin)
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