Sangha Virtual

 Estudos Budistas

Tradição do Ven. Thich Nhat Hanh

 

Nosso encontro com a vida

 

O poder da autocura existe como uma realidade, mas não acreditamos nele. Acreditamos mais em outras coisas. Tomamos muitas vitaminas, tomamos muitos remédios que podem ser mais prejudiciais ao nosso corpo do que se você não tomar. O animal sabe que quatro dias, cinco dias sem comida não faz mal, só pode ajudar. Mas temos muito medo de jejuar. Achamos que, se não comermos, ficaremos enfraquecidos e não haverá cura. Isso não é verdade.

 

Nos tempos antigos, as pessoas costumavam jejuar por várias semanas. Essa é uma maneira maravilhosa de iniciar a cura em nosso corpo e até mesmo em nossa consciência. Em Plum Village, organizamos retiros de jejum. Ficar sem comer por duas ou três semanas é algo que todos nós podemos fazer. Durante o tempo de jejum, fazemos tudo, seguimos a programação. Durante as duas semanas de jejum, continuei a dar palestras sobre o Dharma, pratiquei a meditação andando coletiva ao ar livre com minha sangha. Continuei a praticar sentar e fazer o trabalho diário.

 

Mas se você tem medo dentro de si, você não pode fazer isso. Você não tem confiança, mas nosso corpo pode ficar sem comida por várias semanas. Pular o jantar e usar esse tempo apenas para relaxamento total ou meditação lenta é algo que você pode tentar. Quando você experimenta a alegria do jejum, então você tem fé na prática. A capacidade de autocura existe como uma realidade não apenas no corpo, mas também na consciência. Temos que confiar.

 

Há algo em nós que vale a pena confiar, que é o poder de compreender, de curar, do amor em nós. Esse é o nosso refúgio, esse é o Buda, esse é o reino de Deus existente dentro de nós. Se perdermos nossa fé, nossa confiança, perdemos tudo. Isso não é algo abstrato, é muito real, você pode tocar, segurar, pode refugiar-se nisso. Em vez de entrar em pânico, em vez de se entregar ao desespero, pratique a respiração consciente e coloque sua confiança nela.

 

O poder da autocura, da autocompreensão e do amor está presente em nós. Isso é o que chamamos de ilha dentro de nós, na qual podemos nos refugiar. Seja uma ilha dentro de você. Existe uma ilha de paz, de confiança, de solidez, de amor, de liberdade, dentro de nós. Não temos que procurá-la em outro lugar, está dentro de nós. A respiração consciente pode nos ajudar a voltar para aquela ilha preciosa onde podemos encontrar nosso próprio alicerce. A própria base do nosso ser em uma ilha.

 

Quando você se encontra em uma situação que é perigosa, que é confusa, quando tem a impressão de que está se perdendo, a prática da respiração consciente ajuda a voltar para a ilha do eu. A ilha dentro de nós é muito importante. Você pode fazer isso na posição sentada ou deitada. Você pode colocar a mão sobre o estômago para poder prestar atenção ao subir e descer do estômago e praticar a respiração consciente.

 

Seja uma ilha dentro de você. “Buda, é minha atenção plena brilhando perto, brilhando longe.” “Dharma é minha respiração atenta protegendo corpo e mente, o jardim do corpo e da mente.” “Sangha são meus cinco skandhas operando em harmonia, refugiando-se em mim mesmo, voltando a mim mesmo. Estou livre, estou livre do medo, da confusão.” À medida que você continua este exercício de respiração consciente, você se refugia na ilha segura da atenção plena e recupera sua calma, sua solidez e se sente muito melhor.

 

A prática é baseada no insight, que a atenção plena é a energia do Buda. que está em nós. Estar atento significa estar presente, corpo e mente totalmente presentes unidos, e não em um estado de dispersão. A atenção plena é o tipo de energia que geramos ao caminhar e respirar com atenção. É um agente protetor porque dentro da atenção plena existe a energia de concentração e insight.

 

A atenção plena nos possibilita compreender como aceitar, amar e aliviar o sofrimento. É por isso que a ilha da atenção plena é o melhor lugar para nos refugiarmos. Você pode se refugiar na ilha da atenção plena pela prática de sentar, andar, respirar. Mesmo durante o tempo que você lava a louça, pode se refugiar na ilha da plena atenção. Antes de falecer, o Buda recomendou a seus alunos que se refugiassem na ilha da atenção plena dentro de si mesmos. A prática de descansar, o processo de parar é muito crucial. Se você não consegue descansar é porque não parou. Você continua a correr e começou a correr há muito tempo. Continuamos a correr mesmo durante o sono.

 

Temos a impressão de que felicidade, o bem-estar não são possíveis aqui e agora. Essa crença é inerente a nós. Recebemos a semente dessa crença de nossos pais, nossos avós. Eles têm lutado por toda a vida e acreditam que a felicidade é possível, e só é possível, no futuro. É por isso que nós, como filhos de nossos pais, continuamos a correr e nossos filhos continuarão a correr também.

 

Acreditamos que a felicidade é algo que podemos buscar no futuro, mas o ensinamento do Buda é que você pode ser feliz agora, bem aqui. As condições do seu bem-estar, da sua felicidade podem ser encontradas aqui e agora. Esse é o ensinamento de viver feliz no momento presente. drshta dharma sukha vihari.

 

Se você for capaz de parar, e se estabelecer no aqui e agora, reconhecerá que existem muitos elementos de felicidade disponíveis neste momento, mais do que o suficiente para sermos felizes. Mesmo que haja algumas coisas que não estejam do nosso agrado, ainda existem muitas condições positivas para a nossa felicidade.

 

Quando visitamos nosso jardim, podemos ver uma árvore morrendo, podemos ficar tristes por isso. Podemos não ser capazes de desfrutar do nosso jardim, que ainda é lindo. Mas todas as outras árvores ainda são vigorosas e bonitas. Nós permitimos que algumas árvores morrendo destruam nossa apreciação por todas as outras árvores que ainda estão vivas, bonitas e vigorosas.

 

(Palestra de Dharma de Thich Nhat Hanh em 24 de maio de 1998 – transcrito do vídeo do YouTube

https://youtu.be/s6h-UrqRcZQ)

Traduzido por Leonardo Dobbin)

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